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Crédito à habitação: bonificação dos juros é “dinheiro desperdiçado”, diz Nuno Rico

A medida de bonificação dos juros do crédito à habitação é “dinheiro desperdiçado”, defende Nuno Rico da DECO PROTESTE. Saiba porquê.

 

“A intenção é boa, mas é literalmente dinheiro dos contribuintes que vai ser desperdiçado”. É esta a posição de Nuno Rico, economista da DECO PROTESTE, relativamente à bonificação temporária de juros, uma medida em vigor desde março, e até ao final de 2023, para apoiar as famílias em dificuldades para pagar as prestações do crédito à habitação devido à subida das taxas de juro.

O especialista em produtos bancários falava no podcast POD Pensar “A Paz, o Pão. E a habitação?”, que contou também com a arquiteta Helena Roseta, autora da primeira Lei de Bases da Habitação em Portugal, e Sandra Marques Pereira, socióloga e investigadora do Centro de Estudos sobre a Mudança Socioeconómica e o Território (ISCTE). No programa da DECO PROTESTE, Nuno Rico lamentou os mais de 400 milhões de euros que irão ser gastos, “dinheiro dos contribuintes” que “não vai servir para ajudar as pessoas” e “faz falta para tantas outras áreas”.

Perceba porque é que a medida vai ter, segundo o economista, um “impacto muitíssimo reduzido” no alívio às famílias.

Bonificação de juros pode não passar de alguns euros

O valor do apoio ao crédito à habitação depende do apuramento da diferença entre a taxa de juro contratada no início do empréstimo e a taxa de juro atual. O apoio é concedido se a diferença exceder três pontos percentuais. Por exemplo, se contratou o empréstimo com o indexante 0,25% e este atualmente já é de 3,50 por cento.

Nesse caso, o apoio corresponderá a 50% da variação dos juros da parte que ultrapassa esses três pontos percentuais. Voltando ao exemplo anterior, o apoio incidirá sobre metade de 0,25% do indexante. Ou seja, 0,25% era o indexante no início do contrato; até 3,25% o Estado não apoia com a bonificação de juros; de 3,25% para 3,50%, vão 0,25%, que o Estado bonifica em metade.

O apoio é elevado para 75% da variação dos juros no caso das famílias cujos rendimentos brutos anuais sejam inferiores a 20 700 euros (corresponde ao 4.º escalão de IRS).

Para ajudar os ouvintes do podcast a entenderem o alcance da medida, Nuno Rico exemplificou. Uma família que tenha contratado 125 mil euros de crédito, em janeiro de 2020, com uma Euribor a 12 meses e tenha direito à bonificação de 75%, recebe 1,22 euros mensais de bonificação de juros. “Dá para um café”, ironizou o economista, acrescentando que, na revisão mais recente do contrato, a prestação mensal havia sofrido um agravamento de 184 euros.

Rico deu outro exemplo, de uma família com um crédito de 200 mil euros, que na mais recente revisão do contrato viu a prestação mensal agravar 449 euros. Com a bonificação de 50%, “porque é uma família com rendimentos mais altos”, tem direito a uma redução na mensalidade de 25,83 euros, explicou.

Por este motivo, o moderador do podcast, Aurélio Gomes, e Nuno Rico concordaram que o apoio é “poucochinho”. Para a arquiteta Helena Roseta, a medida “vai ter resultados pífios”, considerando que “é um balde de água fria”.

Conheça outros temas debatidos no podcast:

Acesso aos juros bonificados é um “labirinto”

Nuno Rico considera que “o acesso aos juros bonificados é um autêntico labirinto”, uma vez que os beneficiários têm de cumprir obrigatoriamente oito critérios.

Essas condições são, cumulativamente:

  • crédito para aquisição ou construção de habitação própria e permanente contratado até 15 de março de 2023;
  • empréstimo indexado à Euribor em que a diferença entre o indexante contratado inicialmente e o indexante atual já seja superior a três pontos percentuais;
  • montante inicial contratado inferior a 250 mil euros;
  • empréstimos apenas com taxa variável ou com taxa mista, mas que estejam a atravessar o período de taxa variável;
  • empréstimos com as prestações regularizadas;
  • taxa de esforço atual superior a 35% no crédito à habitação (não inclui outros créditos contratados pela família);
  • declaração de IRS do ano anterior que comprove rendimentos brutos totais do agregado familiar até 38 632 euros (corresponde ao 6.º escalão de IRS) ou, caso a declaração de IRS do ano anterior apresente rendimentos superiores, documentos que comprovem que os rendimentos brutos atuais do agregado familiar são inferiores a 38 632 euros anuais e que o agregado sofreu uma quebra de rendimentos superior a 20 por cento;
  • património mobiliário, como contas bancárias, certificados de aforro, ações ou fundos, por exemplo, que não ultrapasse 29 786,66 euros (corresponde a 62 indexantes dos apoios sociais).

Nuno Rico critica "algumas curiosidades" no acesso à bonificação dos juros, como o cálculo da taxa de esforço ter apenas em conta o crédito à habitação, quando o Banco de Portugal indica que se considerem todos os créditos contratados pela família.
 

DECO PROTESTE exige um travão à subida da prestação

Por considerar que as medidas aprovadas são insuficientes, a DECO PROTESTE propõe, numa carta aberta, um novo modelo de cálculo das prestações de crédito à habitação.

Nos contratos de taxa variável, as famílias que tenham sofrido um agravamento da taxa de juro aplicável ao contrato superior a três pontos percentuais, e cuja taxa de esforço seja superior a 35%, devem ter acesso a um regime de financiamento a taxa variável de prestações constantes.

Saiba o que exige a DECO PROTESTE e junte-se à causa: Travão à subida da prestação